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sábado, 10 de abril de 2010

RAUL DE LEONI


Raul de Leôni Ramos nasceu em Petrópolis-RJ, e faleceu na "Vila Serena", em Itaipava-RJ, (30 de outubro de 1895 - 21 de novembro de 1926). Bacharel em Direito, prosador, diplomata e político. Chegou a eleger-se deputado estadual.
Acima dessas coisas foi poeta.Foi o poeta de maior realce na última fase do simbolismo, e justamente considerado como uma das figuras mais notáveis do soneto brasileiro de todos os tempos.Parnasianos, simbolistas e até modernistas o têm em alta conta, apreciando-o sem reservas. Cada um de seus versos tem sonoridade e ritmo primorosos, especialmente os dos sonetos, em decassílabos, mesclados de simbolismo e de modernismo, com tessitura clássica e técnica parnasiana. São versos considerados dos mais perfeitos: em idéia, filosofia, e essência das temáticas.
O seu ritmo peculiar e admirável de versificação, o conjunto de idéias sublimes de suas palavras, são os aspectos mais fortes que envolvem a magnífica harmonia da unidade de pensamento que existe em toda sua obra.A sua poesia embora contenha formas antigas e clássicas, é caracterizada por um imperecível espírito de modernidade, o que lhe assegura compreensão ilimitada e aperiódica, e o introduz na seleta plêiade dos poetas imortais. Para melhor entendimento sobre a poesia de Raul de Leôni é preciso voltar ao século passado, precisamente em 1922, quando publicou o seu livro clássico "Luz Mediterrânea", onde está a essência da sua poesia, (grande parte em sonetos decassílabos) no meio da "explosão" do modernismo no Brasil.

Texto de José Antonio Jacob


INGRADITÃO



Nunca mais me esqueci! ... Eu era criança
E em meu velho quintal, ao sol-nascente,
Plantei, com a minha mão ingênua e mansa,
Uma linda amendoeira adolescente.

Era a mais rútila e íntima esperança...
Cresceu... cresceu... e aos poucos, suavemente,
Pendeu os ramos sobre um muro em frente
E foi frutificar na vizinhança...

Daí por diante, pela vida inteira,
Todas as grandes árvores que em minhas
Terras, num sonho esplêndido semeio,

Como aquela magnífica amendoeira,
E florescem nas chácaras vizinhas
E vão dar frutos no pomar alheio...


LEGENDA DOS DIAS


O Homem desperta e sai cada alvorada
Para o acaso das cousas... e, à saída,
Leva uma crença vaga, indefinida,
De achar o Ideal nalguma encruzilhada...

As horas morrem sobre as horas... Nada!
E ao poente, o Homem, com a sombra recolhida
Volta, pensando: "Se o Ideal da Vida
Não vejo hoje, virá na outra jornada...

Ontem, hoje, amanhã, depois, e, assim,
Mais ele avança, mais distante é o fim,
Mais se afasta o horizonte pela esfera;

E a Vida passa... efêmera e vazia:
Um adiantamento eterno que se espera,
Numa eterna esperança que se adia...


PUDOR



Faze a tua sagrada penitência,
Fecha-te num silêncio superior,
Mas não mostres a tua decadência
Ao mundo que assistiu teu esplendor!

Foge de tudo para o teu nadir!
Poupa ao prazer dos homens o teu drama!
Que é mesmo triste para os olhos ver

E assistir, sobre o mesmo panorama,
A alegoria matinal subir
E a ronda dos crepúsculos descer...


Raul de Leoni

A TUA BOCA É UM RIO


Como é belo e suave o seu caudal
ternas e envolventes são as ondas
que o invadem e possuem.

Quero-o desaguado em mim.
Hei-de chamar-lhe meu.
porque a tua boca é um rio

onde sacio toda a minha sede
onde abarcam todos os meus beijos
onde flutuam todos os meus sonhos.

Se vier a tempestade
posso guardar-te no porto da minha paixão.
que Está sempre aberto para ti.

É. A tua boca é um rio.
como é bom morrer de desejo
afogado na doçura do teu leito.


JP

JONI MITCHELL - Woman Of Heart And Mind -

PETER GREEN - Just For You -

DECIDI...


"E assim, depois de muito esperar, num dia como outro qualquer, decidi triunfar...
Decidi não esperar as oportunidades e sim, eu mesmo buscá-las.
Decidi ver cada problema como uma oportunidade de encontrar uma solução.
Decidi ver cada deserto como uma possibilidade de encontrar um oásis.
Decidi ver cada noite como um mistério a resolver.
Decidi ver cada dia como uma nova oportunidade de ser feliz.
Naquele dia descobri que meu único rival não era mais que minhas próprias limitações e que enfrentá-las era a única e melhor forma de as superar.
Naquele dia, descobri que eu não era o melhor e que talvez eu nunca tivesse sido.
Deixei de me importar com quem ganha ou perde.
Agora me importa simplesmente saber melhor o que fazer.
Aprendi que o difícil não é chegar lá em cima, e sim deixar de subir.
Aprendi que o melhor triunfo é poder chamar alguém de"amigo".
Descobri que o amor é mais que um simples estado de enamoramento, "o amor é uma filosofia de vida".
Naquele dia, deixei de ser um reflexo dos meus escassos triunfos passados e passei a ser uma tênue luz no presente.
Aprendi que de nada serve ser luz se não iluminar o caminho dos demais.
Naquele dia, decidi trocar tantas coisas...
Naquele dia, aprendi que os sonhos existem para tornar-se realidade.
E desde aquele dia já não durmo para descansar... simplesmente durmo para sonhar."


(Walter Elias Disney 1901-1966)

TROVAS - Cantigas Que Alguém Espera -


As velas pandas ao vento...
Doidas gaivotas pelo ar...
Você no meu pensamento
E, entre nós dois o mar.


Saudoso de ti, tristonho,
procuro o sono com ânsia
porque, nas asas do sonho,
torno menor a distância.


Na ausência do teu carinho
torturado de desejos,
rolo em meu leito, sozinho,
beijando meus próprios beijos.


Olhos presos à amazona,
velho palhaço risonho
faz, sob o teto de lona,

os seus castelos de sonho.

Por te querer me torturo,
sem saber, em minha dor,
que mistérios o futuro
reservou ao nosso amor!


Cantando canções antigas,
a serenata me encanta
porque repete as cantigas,
que a minha saudade canta.


Ai amor, que me fugiste
e deixaste tantas mágoas!
Sou, hoje um salgueiro triste
chorando à beira das águas


Carlos Guimarães

ARGILA


Nascemos um para o outro, dessa argila
De que são feitas as criaturas raras;
Tens legendas pagãs na carnes claras
E eu tenho a alma dos faunos na pupila...

Às belezas heróicas te comparas
E em mim a luz olímpica cintila,
Gritam em nós todas as nobres taras
Daquela Grécia esplêndida e tranqüila...

É tanta a glória que nos encaminha
Em nosso amor de seleção, profundo,
Que (ouço de longe o oráculo de Elêusis),

Se um dia eu fosse teu e fosses minha,
O nosso amor conceberia um mundo,
E do teu ventre nasceriam deuses...


Raul De Leoni

FERNANDO PEREIRA - Chico Buarque & Maria Bethânia -

LEO SAYER - The Innocent Bystander -

PAULO RICARDO - Is This Love -

CAETANO VELOSO - London London -

sexta-feira, 9 de abril de 2010

A RESPIRAÇÃO DA TERRA

GIPSY KINGS - Gitano Soy -

DIÁLOGO ENTRE A TERRA E UMA ESTRELA



E a Terra perguntou com ironia:
"--Quem é você, estrela cintilante,
Que, aí no Espaço, sente-se importante,
Se nem consegue ver a luz do dia?"

A estrela a inquiriu: "--Você o que é,
Além de um Globo de pesares, dores...
Onde há doenças, guerras e tremores;
Onde cresce a descrença e morre a fé?"

"Ah! -disse a Terra- sei que nas alturas,
Não há paisagens, mar, nem criaturas...
O que de bom pode existir aí ?"

Mas remata a estrela calma e mansa:
" - Aqui onde me encontro há esperança,
ÀS ALMAS QUE LIBERTAM-SE DAÍ"


Sá de Freitas

DEPOIS DA TEMPESTADE


Sem mais nuvens o sol volta radiante,
A ignorar a tempestade ida...
E a gente, em cada canto, sente a vida,
Torna-se mais alegre e mais vibrante.

E vendo tudo isso... num instante
Sinto que se a existência for sofrida,
Pode ter sua dor toda vencida,
Se o coração, de amor, for transbordante.

Na vida as tempestades vêm e passam,
Mas com esperança os seres não fracassam,
Ante a fúria do vento a enfrentar.

E por mais que as dores sejam intensas ,
Lembremos-nos que além das nuvens densas,
O amor de Deus não cessa de brilhar.


Sá de Freitas

LAURA RIDING


Laura Riding Gottschalk, pseudônimo de Laura Reichenthal (16 de janeiro de 1901 - 2 de setembro de 1991), poeta norte-americana. A partir de 1963 assinava seus trabalhos como Laura (Riding) Jackson.

TARDE

A febre da tarde
Se chama tarde,
Velho sono arrancado,
Cedo demais para ser noite,
Sem outro nome, pois não há nome
De tarde além da tarde.

o amor tenta falar mas soa
Tão perto em seu próprio ouvido.
Os tic-tacs escutam
O que os tic-tacs retrucam.
A febre preenche onde gargantas se mostram,
Mas nesses horrores nada tenta engolir
Enquanto a sede persegue a tarde
Até o rouco pôr-da-sol.

O entardecer surge com bocas
Quando a tarde pode falar.
A ceia e a cama começam e terminam
E o amor obscurece o pensar.
Mais tardes dividem a noite,
Novo sono arrancado,
Suspensão desperta entre sonho e sonho ­
Nunca soubemos quanto.
O sol se atrasa por horas de logo e logo ­
Então chega a febre veloz chamada dia.

Mas a febre lenta se chama tarde.

tradução: Rodrigo Garcia Lopes

ABRIR DOS OLHOS

Pensamento dando para pensamento
Faz de alguém um olho.
Um é a mente cega-de-si,
O outro é pensamento ido
Para ser visto de longe e não sabido.
Assim se faz um universo brevemente.

A suposição imensa nada em círculos,
E cabeças ficam mais sábias
Enquanto notam a grandeza,
E a dimensão imbecil
Espaça a Natureza,
E ouvidos reportam primeiro os ecos,
Depois os sons, distinguem palavras
Cujos sentidos chegam por último.

─Vocabulários jorram das bocas
Como por encanto.
E assim falsos horizontes se ufanam em ser
Distância na cabeça
Que a cabeça concebe lá fora.

O maravilhar-se, que escapa dos olhos,
Regressa a cada lição.
O tudo, antes segredo,
Agora é o conhecível,
A vista da carne, a grandeza da mente.

Mas e quanto ao sigilo,
Pensamento individido, pensando
Um todo simples de ver?
Essa mente morre sempre instantaneamente
Ao prever em si, de repente demais,
A visão evidente demais,
Enquanto lábios sem boca se abrem
Mundamente atônitos para ensaiar
O verso simples e impronunciável.

Laura Riding,1970
(Tradução: Rodrigo Garcia Lopes)

LA BAGUET

TÍMIDO VOO


Dos meus sonhos fui a musa
Meus desejos, meus anseios,
perdidos confusos esteios,
sozinha na multidão.
Uma flor viçosa efêmera
sorvendo com avidez teu orvalho,
de esperança desvairada,
alegria antecipada,
sem saber se na verdade
tu me querias ou não.
Como pássaro cativo
procurando uma saída,
na gaiola construída
com pedaços de ilusão.
Incentivada pela brisa
de tuas inebriantes palavras,
das promessas de teus gestos,
do teu venenoso olhar,
ousei ignorar as grades, alçar vôo...
Que loucura!
Um só tiro bem certeiro,
de uma frase sem mira,
pois desviaste o olhar,
atingiu meu peito em cheio,
matando-me os sonhos, os veios,
tirando dos versos as rimas,
escurecendo o luar.


© Eliana Ellinger - Israel
(In Pedaços de Mim)

GHEORGHE ZAMFIR - El Condor Pasa -

GHEORGHE ZAMFIR - My Heart Will Go On -

MAU HUMOR

A AUSENTE



Os que se vão, vão depressa.
Ontem, ainda, sorria na espreguiçadeira.
Ontem dizia adeus, ainda, da janela.
Ontem, vestia, ainda, o vestido tão leve cor-de-rosa.

Os que se vão, vão depressa.
Seus olhos grandes e pretos há pouco brilhavam.
Sua voz doce e firme faz pouco ainda falava,
Suas mãos morenas tinham gestos de bênçãos.

No entanto, hoje, na festa, ela não estava.
Nem um vestígio dela, sequer.
Decerto sua lembrança nem chegou, como os convidados
Alguns, quase todos, indiferentes e desconhecidos.

Os que se vão, vão depressa.
Mais depressa que os pássaros que passam no céu.
Mais depressa que o próprio tempo,
Mais depressa que a bondade dos homens,
Mais depressa que os trens correndo nas noites escuras,
Mais depressa que a estrela fugitiva
Que mal faz um traço no céu.

Os que se vão, vão depressa.
Só no coração do poeta, que é diferente dos outros corações,
Só no coração sempre ferido do poeta
É que não vão depressa os que se vão.

Ontem ainda sorria na espreguiçadeira,
E o seu coração era grande e infeliz.
Hoje, na festa, ela não estava, nem a sua lembrança.
Vão depressa, tão depressa os que se vão...


Augusto Frederico Schmidt
(1906-1965)

ESPERO POR TI



Espero por ti na esquina de um segredo,
Às sete da manhã de um qualquer dia,
Com a mesma impaciência e alegria
Da criança que aguarda o seu brinquedo.

Estou sozinha, na esquina, e sinto medo...
Não posso nem explicar quanta ousadia,
Que estranha compulsão me guiaria
Os passos sobre as pedras do lajedo?

Já não sei se virás. Que Deus nos guarde!
Não tarda irão abrir-se outras janelas,
O sol há-de nascer, far-se-á tarde…

Não te esqueças de mim, sozinha, aqui,
Esperando essoutro alguém que não revelas
Enquanto eu vou esperando só por ti…


Maria João Brito de Souza

HOLE - Malibu -

OTTO - Crua -

TODOS OS CAMINHOS ME SERVEM


Todos os caminhos me servem.
Em todos serei o ébrio
cabeceando nas esquinas.
Uma rua deserta e o hálito
das pessoas que se escondem,
uma rua deserta e um rafeiro
por companheiro.

Ó mar que me sacode os cabelos
que mulher alguma beijou,
lágrimas que os meus olhos vertem
no suor dos lagares,
que uma onda vos misture
e vos leve a morrer
numa praia ignorada.


Fernando Namora, in "Mar de Sargaços"

quinta-feira, 8 de abril de 2010

MATRIOSHKA


Diz a lenda que no século XIX, um poderoso senhor russo chamado Alexei Manontov Moscou estava transportando uma figura de porcelana da ilha de Honshu, no Japão, um presente para sua amada.
A figura, representando um monge budista, foi aberto, e dentro havia uma outra figura idêntica menores.
Tanto gostou que peça, que Manontov mostrou-lo para um artesão e este, inspirado pela porcelana japonesa, figura esculpida em madeira de tília de uma aldeia russa, e oito figuras idênticas, cada vez mais pequeno, que se encaixam um dentro do outros, para abrir toda a metade.
Estou falando de Vasili artesão Zvezdochkin e que mais tarde seria conhecido como o mundo Matrioshka, características bonecas russas. Eles representam uma espécie de maternidade folk: mulheres vestidas com o Sarafan caso famoso, pintados com cores brilhantes e enfeitadas com flores, pássaros e estrelas. Cada matrioshka é única e original. Milhões deles atualmente circulam ao redor do globo e esculpida em madeira de tília ou de bétula, com desenhos atuais, mas sempre com a singularidade da forma e conteúdo, muitos destes "segredos" que casa.

A Matrioshka é brincar com o infinito...

ANTONIO MACHADO


Antonio Machado nasceu em 26 de julho de 1875 em Sevilha e aos oito anos mudou-se para Madrid. Poeta e prosista, pertenceu ao movimento literário conhecido como “geração de 98″. Provavelmente, ainda é o poeta de sua época mais lido.
Em 1893 publicou seus primeiros escritos em prosa, enquanto que seus primeiros poemas apareceram em 1901. Em 1899, viajou à Paris, cidade que voltaria a visitar em 1902, ano em que conheceu Rubén Darío, que seria seu grande amigo por toda a vida. Em Madrid, por essa mesma época, conheceu Unamuno, Valle-Inclán, Juan Ramón Jimenez e outros destacados escritores com os quais manteve uma estreita amizade. Foi catedrático em francês, e se casou com Leonor Izquierdo, que morreu em 1912.
Em 1927 foi eleito membro da Real Academia Española. Durante os anos vinte e trinta, escreveu teatro em companhia de seu irmão, também poeta, Manuel, estreando várias obras entre as quais se destacam: La Lola se va a los puertos, de 1929 e La Duquesa de Benameji, de 1931. Quando estourou a Guerra Civil espanhola, estava em Madrid. Posteriormente mudou-se para Valencia e Barcelona, e em janeiro de 1939 exilou-se em Colliure, França, onde morreu em 22 de fevereiro do mesmo ano.


CAMINHANTE



Caminhante, são teus rastos
o caminho, e nada mais;
caminhante, não há caminho,
faz-se caminho ao andar.
Ao andar faz-se o caminho,
e ao olhar-se para trás
vê-se a senda que jamais
se há-de voltar a pisar.
Caminhante, não há caminho,
somente sulcos no mar.


O SONHO




Era um menino a sonhar
com um cavalo de cartão.
O menino abriu os olhos
e não viu o cavalinho.
Com um cavalinho branco
ele voltou a sonhar;
pelas crinas o prendia…
Assim não te escaparás!
Mal o conseguiu prender,
logo o menino acordou.
Tinha a sua mão fechada.
O cavalinho voou!
O menino ficou sério,
pensando não ser verdade
um cavalinho sonhado.
Já não voltou a sonhar.
E o menino fez-se moço
e o moço teve um amor,
e dizia à sua amada:
Tu és de verdade ou não?
Quando o moço se fez velho
pensava: Tudo é sonhar,
o cavalinho sonhado
e o cavalo de verdade.
E quando chegou a morte,
o velho ao seu coração
perguntava: Tu és sonho?
Quem saberá se acordou!



Antonio Machado, 1926
(Tradução de José Bento)

ASSIM, SEM NADA


Assim, sem nada feito e o por fazer
Mal Pensado, ou sonhado sem pensar,
Vejo os meus dias nulos decorrer,
E o cansaço de nada me aumentar.

Perdura, sim, como uma mocidade
Que a si mesma se sobrevive, a esperança,
Mas a mesma esperança o tédio invade,
E a mesma falsa mocidade cansa.

Tênue passar das horas sem proveito,
Leve corrrer dos dias sem ação,
Como a quem com saúde jaz no leito
Ou quem sempre se atrasa sem razão.

Vadio sem andar, meu ser inerte
Contempla-me, que esqueço de querer,
E a tarde exterior seu tédio verte
Sobre quem nada fez e nada quer.

Inútil vida, posta a um canto e ida
Sem que alguém nela fosse, nau sem mar,
Obra solenemente por ser lida,
Ah, deixem-se sonhar sem esperar.


Fernando Pessoa

MELISSA ETHERIDGE - Piece Of MyHeart -

PORTER - Surround Me WithYour Love -

ARTE EM LÁPIS






A ARTE DE SER AMADA


Eu sou líquida mas recolhida
no íntimo estanho de uma jarra
e em tua boca um clavicórdio
quer recordar-me que sou ária

aérea vária porém sentada
perfil que os flamingos voaram.
Pelos canteiros eu conto os gerânios
de uns tantos anos que nos separam.

Teu amor de planta submarina
procura um húmido lugar.
Sabiamente preencho a piscina
que te dê o hábito de afogar.

Do que não viste a minha idade
te inquieta como a ciência
do mundo ser muito velho
três vezes por mim rodeado
sem saber da tua existência.

Pensas-me a ilha e me sitias
de violinos por todos os lados
e em tua pele o que eu respiro
é um ar de frutos sossegados.


Natália Correia, in "O Vinho e a Lira"

POEMA INVOLUNTÁRIO


Decididamente a palavra
quer entrar no poema e dispõe
com caligráfica raiva
do que o poeta no poema põe.

Entretanto o poema subsiste
informal em teus olhos talvez
mas perdido se em precisa palavra
significas o que vês.

Virtualmente teus cabelos sabem
(..)
as insólitas flores que se abrem
não têm sua cor nem seu cheiro.

Finalmente vejo-te e sei que o mar
o pinheiro a nuvem valem a pena
e é assim que sem poetizar
se faz a si mesmo o poema.

.
Natália Correia, in "O Vinho e a Lira"

DIANE BIRCH - Valentino Lyrics -

ELLIE GOOULDING & eRIK hASSLE - Be Mine -

JOE SATRIANI - Made Of Tears -

quarta-feira, 7 de abril de 2010

RUI PAIS


O próprio poeta Rui Pais descreve a sua breve biografia de forma bela e poética: "Nasci no Algarve, Portimão (Portugal), junto à Praia da Rocha. Esta é a minha praia preferida! Talvez por ter nascido junto ao mar, sinta por ele uma grande atracção, como se fizesse parte do meu ser. Não me imagino a viver afastado do mar, parece que quando estou perto, ele fala comigo! Resido na Linha do Estoril, próximo de Lisboa, A vista de minha casa para o mar reaviva o meu espírito! Nasci no dia 15 de Maio, adoro a Primavera. Parece que tudo renasce nesta período, como um ciclo de vida que se renova a cada Primavera. Admiro o Sol, quase como uma Divindade, gosto de sentir o seu calor! Detesto os dias cinzentos de Inverno que me deprimem. Noto que o tempo tem uma influência extraordinária sobre mim. Tenho prazer em ler bons livros, mais de astronomia, ciência, psicologia, filosofia, ficção científica, poesia, história e outros. Não consigo viver sem música, é para mim tão importante, como a alimentação que necessito para viver. Mas não é só isso, é muito mais, é como um elixir que movimenta e dá sentido à minha alma e meus sentidos, que penetra no âmago de minha mente e me faz ver as coisas de forma diferente, onde tudo parece chegar ao pormenor, como se fosse um outro companheiro inseparável, mas ao mesmo tempo meu conselheiro! Não perco um bom filme, em particular de ficção científica, onde antecipamos um futuro distante de forma imaginativa e criativa, que por vezes parece aproximar-se duma realidade que um dia será vivida! Viajo muito, por motivos de minha actividade profissional, que é o turismo. Acompanho grupos de turistas em viagens de longo curso para o exterior, normalmente com saída de Portugal, tendo como destino, com mais incidência a Europa. Gosto de frases curtas e inteligentes, e é neste contexto que dou grande valor aos pensamentos!"



A GAIVOTA E OS HOMENS

Uma gaivota exibia seu voo
Próximo dum paredão!
Em círculos ia e vinha…
Como os homens vêem e vão!

Eles gozavam da sua pesca
Lançando e içando o anzol…
Num passeio à beira-mar
Onde veneravam o Sol!




COMPARANDO O HOMEM E A ÁRVORE

A árvore tem múltiplas aplicações sem fim
Nos bancos dum parque ao som dum clarim.
O homem debaixo dela protege-se do Sol
Como o invólucro que envolve o caracol.

O homem carece de constante alimento…
A árvore dá-lhe frutos para seu sustento.
Também lhe retiramos a madeira…
A lenha tem energia que aquece a lareira.

Há árvores que vivem uma eternidade…
O homem não detém tal longevidade.
Assim como ele veio, um dia vai…
Ela consegue resistir quando ele cai.

A árvore é símbolo de vida ambiental.
Depois de ser serrada e derrubada…
É cortada, aplanada, transformada.
Ainda leva o homem a sepultar
Lembra a árvore que o viu gatinhar.




VEM DO SOL

Um dia eu compreendi
Que a luz que vinha do sol
Estava muito mais para além
Daquele simples pensar
Que toda a gente tem…

Meditando eu deduzi
Que a vida ia germinando
A partir de ti…

Assim como a chuva
Lembra canais de irrigação
Alimentando a terra
Antes dela dar o grão…


Rui Pais

MARIA MENA - This Bottle Of Wine -

GOSTAR DE TI

UMA PAIXÃO


Visita-me enquanto não envelheço
toma estas palavras cheias de medo e surpreende-me
com o teu rosto de Modigliani suicidado

tenho uma varanda ampla cheia de malvas
e o marulhar das noites povoadas de peixes voadores
vem

ver-me antes que a bruma contamine os alicerces
as pedras nacaradas deste vulcão a lava do desejo
subindo à boca sulfurosa dos espelhos
vem

antes que desperte em mim o grito
de alguma terna Jeanne Hébuterne a paixão
derrama-se quando a tua ausência se prende às veias
prontas a esvaziarem-se do rubro ouro
perco-te no sono das marítimas paisagens
estas feridas de barro e quartzo
os olhos escancarados para a infindável água
vem

com teu sabor de açúcar queimado em redor da noite
sonhar perto do coração que não sabe como tocar-te


Al Berto

LE TOUR DU MOND EM 80 SECONDES

OLHARES CANSADOS


Corpos:
Suados, cansados, mirrados,
Que pela seara* vêm caminhando.
Olhares:
Mortos, vagos, parados,
Sem forças para olhar.
Cérebros que pensam sem pensar,
Pernas que andam sem andar,
Obedecendo a uma rotina
Que a mente já não pode controlar.
A vida passou ao lado,
Mas nem a morte quis ficar!
Ficou apenas um sono,
Uma letargia,
Que transforma os homens
Em mortos vivos,
Que nem ousam sequer pensar.
Não ousam...
Não ousam, ou já esqueceram,
Pois há já muito tempo que não pensam.
Trabalham, apenas....
II
Olhares cansados que se cruzam,
Sem se dar conta de que o fazem,
Pois que se esquecem de olhar.
Olhares mortos, vagos, parados,
Guardam ainda na retina
A seara* de tomate que todo o dia contemplaram...
O dia alongou-se, parecia não ter fim...
E quando o corpo se vergava, por fim,
O pôr-do-sol chegou...
E com ele, um vermelho quente, sem vida, desmaiado
(como os olhos voltando da seara*),
Inundou tudo, como se a seara* fosse de fogo.
E depois a noite desceu...
Agora, a caminho da aldeia,
As mentes fatigadas, as pernas cansadas,
Os olhares parados, as mãos calejadas,
Querem apenas o repouso merecido.
Comem não para viver,
Mas para cumprir o mesmo ritual...
Espera-os uma noite agitada,
Trabalhando como sempre na seara*,
Pois a mente, cansada,
Nada mais consegue sonhar!
E levantam-se antes do nascer do sol,
Para mais um dia de trabalho.
A noite não lhes deu repouso:
A mente não descansou, só o corpo.
E lá vão...
Olhares cansados,
Mortos, vagos, parados,
A caminho, como voltaram,
Da seara*...

Luis Beirão

NA SOLIDÃO DAS NOITE ÚMIDAS


Como tenho pensado em ti na solidão das noites úmidas,
De névoa úmida,
Na areia úmida!
Eu te sabia assim também, assim olhando a mesma cousa
No ermo da noite que repousa.
E era como se a vida,
Mansa, pousasse as mãos sobre a minha ferida...

Mas, ah! como eu sentia
A falta de teu ser de volúpia e tristeza!
O mar... Onde se via o movimento da água,
Era como se a ádua estremecesse em mil sorrisos.
Como uma carne de mulher sob a carícia.
O luar era um afago tão suave,
- Tão imaterial -
E ao mesmo tempo tão voluptuoso e tão grave!
O luar era a minha inefável carícia:
A água era teu corpo a estremecer-se com delícia.

Ah! em música, pôr o que eu então sentia!
Unir no espasmo da harmonia
Esses dois ritmos contrastantes:
O frêmito tão perdidamente alegre de amor sob a carícia
E essa grave volúpia da luz branca.

Oh! viver contigo!
Viver contigo todos os instantes...
Harmoniosa e pura,
Sem lastimar a fuga irreparável dos anos,
Dos anos lentos e monótonos que passam,
Esperando sempre que maior ventura
Viesse um dia no beijo infinito da mesma morte...


Manuel Bandeira
(1886-1968)

SOFRO DE NÃO TE VER


Sofro
de não te ver,
de perder
os teus gestos
leves, lestos,
a tua fala
que o sorriso embala,
a tua alma
límpida, tão calma...

Sofro
de te perder,
durante dias que parecem meses,
durante meses que parecem anos...

Quem vem regar o meu jardim de enganos,
tratar das árvores de tenrinhos ramos?


Saúl Dias, in "Sangue (Inéditos)"

OTTO - Saudade -

OTTO- Agora Sim -

LEVA-ME CONTIGO

terça-feira, 6 de abril de 2010

GABRIELA MISTRAL


Poetisa chilena (7/4/1889-10/1/1957). É a primeira escritora latino-americana a receber o Prêmio Nobel de Literatura, em 1945. Sua poesia única e repleta de imagens singulares não mostra influências do modernismo nem das vanguardas.
Descendente de espanhóis, bascos e índios, Lucila Godoy Alcayaga nasce em Vicuña, uma vila do norte do Chile. Com apenas 15 anos dá aulas. Seu noivo comete suicídio em 1907, fato que marca sua obra e sua vida. Ela nunca se casa e se dedica somente ao trabalho.
Vence um concurso literário chileno em 1914 com Sonetos de la Muerte, assinados com o pseudônimo Gabriela Mistral, formado a partir do nome de dois poetas que admira, o italiano Gabriele D''Annunzio e o francês Frédéric Mistral.
Seu primeiro livro de poesias, Desolación (1922), inclui o poema Dolor, no qual fala da perda do amado. O sentimento de maternidade frustrada aparece nos trabalhos seguintes, Ternura (1924) e Tala (1938). Colabora na reforma educacional do México e do Chile.
Representa seu país como consulesa em Nápoles, Madri, Lisboa e Rio de Janeiro. Em 1954 publica Lagar. Leciona literatura espanhola na Universidade de Columbia. Morre em Hempstead, no estado de Nova York.



O ENCONTRO


Encontrei-o no caminho.
A água não turvou seu sonho,
nem se abriram mais as rosas.
Mas o assombro entrou-me na alma.
E uma pobre mulher tem
o rosto banhado em lágrimas.
Levava um canto ligeiro
sua boca descuidada;
ao olhar-me se tornou
profundo o canto que entoava.
Contemplei a senda, achei-a
estranha, transfigurada.
Tive na alba de diamante
o rosto banhado em lágrimas.
Continuou a andar cantando
e levou os meus olhares.
Então já não foram mais
azuis e esbeltas as salvas.
Que importa! Ficou nos ares
estremecida minha alma.
Ninguém me feriu mas tenho
o rosto banhado em lágrimas.
Essa noite não velou
assim como eu junto à lâmpada;
Longe seu peito de nardo
minha aflição não atinge.
Porém talvez por seu sonho
passe um perfume de acácia,
que uma pobre mulher tem
o rosto banhado em lágrimas.
Ia só e não temia.
Tinha sede e não chorava
Mas desde que o vi passar,
Deus revestiu-me de chagas.
Minha mãe reza por mim
a sua oração confiada.
Mas eu terei para sempre
o rosto banhado em lágrimas.


Gabriela Mistral



EU NÃO SINTO A SOLIDÃO


É a noite desamparo
das montanhas ao oceano.

Porém eu, a que te ama,
eu não sinto a solidão.

É todo o céu desamparo,
mergulha a lua nas ondas.

Porém eu, a que te embala,
eu não sinto a solidão.

É o mundo desamparo,
triste a carne em abandono

Porém eu, a que te embala,
eu não sinto a solidão.

Gabriela Mistral, 1924
(Tradução de Pedro Amaro Filho)

ADÃO E EVA






ANTÓNIO ZAMBUJO - Foi Deus -

PEDRO BARROSO- Menina dos Olhos de Água -

TU ÉS REI, EU SOU RAINHA


Eu sou a fada do norte
O senhor que é meu consorte
É um rei que nunca nasceu
Entrego meu manto sagrado
Ao tempo em troca do brado
Das gramíneas da pradaria
Pois nos prados e nas colinas
Sou a princesa menina
Que nasceu há poucos dias
Corro em torno dos lobos
São meus irmãos e meus mestres
Somos como o cipreste
Nascemos silenciosos...
Cubro o rosto e escuto o lamento
Da coruja e do vento
Não nascemos não vivemos
Abstratos de real linha
Tu ÉS rei eu sou rainha.


Anna Karenina